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Jardim filtrante (Foto: Divulgação/Embrapa)

 

Quando conversou com a Globo Rural por telefone, Flávio Marchesin preparava uma encomenda de 35 mudas de espécies ornamentais que cultiva em seu sítio em São Carlos, interior de São Paulo. A produção foi obtida em apenas 10m², onde há nove anos ele instalou o primeiro jardim filtrante da Embrapa Instrumentação, sistema desenvolvido pela estatal para filtrar águas cinzas, como é chamado o esgoto doméstico que não tenha sido contaminado por fezes e urina – como a água da pia da cozinha e da lavagem de roupas.

“Eu comecei a observar que algumas plantas que a gente usa no sistema pra tratar as águas simples poderiam ser de uso comercial e ornamental e comecei a buscar saber um pouco mais”, conta o produtor.

Entre as espécies estão copo-de-leite, lírio, liriope, papiro chinês, taioba, helicônias, entre outras. “Não dá pra tirar uma grande produção, mas são plantas com alto valor agregado e que são relativamente caras nas lojas especializadas”, explica Marchesin. Segundo ele, cada muda sai na faixa de R$ 30 a R$ 40, podendo, em pouco tempo, cobrir os custos de implantação do sistema, e R$ 1,5 mil a R$ 2 mil. “Acho que em um ano se paga o investimento tranquilo”, avalia.

A ideia inicial, contudo, nunca foi gerar retorno financeiro. Quando aceitou a parceria com a Embrapa para executar o projeto, Marchesin estava num processo de reestruturação da sua propriedade após décadas de agricultura predatória. Em 2001 já tinha instalado uma fossa biodigestora, também desenvolvida pela Embrapa, para tratar fezes e urina.

“O restante nós jogávamos numa vala, mas sabíamos que essa não era a forma mais adequada porque acaba atingindo o lençol freático e estamos ao lado do Ribeirão Feijão, rio que abastece São Carlos. Estávamos muito preocupados com isso”, recorda. Após cinco anos do primeiro jardim, ele construiu um segundo sistema, de 30m², para atender a um projeto de educação ambiental mantido atualmente no sítio.

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O pesquisador da Embrapa, Wilson Tadeu Lopes da Silva, explica que o jardim foi desenvolvido para imitar o que naturalmente ocorre em áreas alagadas naturais, como mangues e várzeas de rio. “A gente aproveitou esse mesmo conceito que a natureza levou milhões de anos para desenvolver e montamos o sistema – que é como se fosse um pequeno lago”, explica.

Na base, uma geomembrana impermeável impede que água contamine o lençol freático enquanto as plantas e os microorganismos presentes no sistema degradam a matéria orgânica oriunda do sabão e do detergente. “O que sai do outro lado é uma água bem tratada e que se presta bem para irrigação em qualquer tipo de cultura”, conta o pesquisador.

A ideia de usar plantas ornamentais também é uma sugestão da Embrapa e visa não só uma questão estética (o que tem atraído o interesse de arquitetos de designers de interiores), mas também a geração de renda e reuso de água no campo – aspectos diretamente relacionados à realidade do produtor rural. “Não dá para simplesmente chegar para a população rural e dizer ‘nós temos a solução de saneamento’. Em alguns locais isso tem apelo, mas em outros não. Por isso também começamos a trabalhar olhando para os aspectos relativos a reuso”, explica Silva ao lembrar dos desafios do saneamento rural no Brasil.

“Esse tipo de coisa é que faz muitas vezes as pessoas repensarem o que é esgoto. Ele não tratado, de fato, é ruim. Mas um esgoto devidamente tratado ele pode, sim, trazer benefícios. E o próprio sistema de tratamento pode ser uma fonte de retorno econômico desde que bem manejado”, conclui o pesquisador.

Esquema de jardim filtrante (Foto: Embrapa/Divulgação)

 
Source: Rural

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