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(Foto: Ueslei Marcelino/Reuters)

 

O aumento expressivo do desmatamento no Brasil em 2019 e 2020 tem relação direta com a falta de regularização fundiária na Amazônia – cerca de 40% da perda de florestas ocorre em área sem definição de direito à terra.

É o que mostra o relatório “Dez fatos essenciais sobre regularização fundiária na Amazônia Legal”, publicado nesta quarta-feira (24/3) pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon).

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Segundo o estudo, os projetos de lei que tramitam no Congresso com a intenção de resolver o problema acabam apenas por enfraquecer as salvaguardas ambientais, além de estimular novas ocupações de terras públicas e, assim, promover ainda mais o desmatamento.

O relatório é o resultado de um levantamento feito entre 2016 e 2020, que envolveu entrevistas com representantes dos institutos de terra estaduais e instituições que atuam no tema e revisão da legislação fundiária dos nove Estados da Amazônia Legal, além de levantamento de dados junto a órgãos federais e estaduais.

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“Com esse relatório, pretendemos auxiliar nesse processo de compreensão dos desafios e recomendar o que pode ser feito para que a União e os Estados adotem leis e práticas fundiárias que contribuam com a conservação e redução de conflitos no campo”, explica Brenda Brito, pesquisadora do Imazon e coordenadora do estudo.

O relatório destaca dez fatos principais para entender como as leis e políticas fundiárias atuais acabam estimulando o desmatamento e a grilagem. Entre eles, estão a falta de destinação ou informações fundiárias em 28,5% da Amazônia Legal; os governos estaduais como responsáveis pela maior parte do território sem destinação na região; e a falta de controle e planejamento para a destinação das terras públicas.

Ainda está na lista a ausência de procedimentos que garantam a destinação de terras públicas de acordo com a hierarquia definida no ordenamento jurídico, como a prioridade de reconhecimento de terras indígenas e áreas necessárias à conservação ambiental.

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Além disso, na análise dos pesquisadores, a maioria das leis incentiva o roubo de terras públicas. “As leis fundiárias vigentes na Amazônia refletem uma visão de que a terra pública está disponível para ocupação e apropriação, o que é um estímulo para a continuidade de invasões no território. Isso ocorre porque poucas leis estaduais determinam qual a data limite em que um particular pode iniciar uma ocupação para receber um título de terra", afirma Jeferson Almeida, pesquisador do Imazon e um dos autores.

Segundo ele, ocupações ocorridas em qualquer ano, inclusive futuramente, seriam, a princípio, elegíveis para receber um título de terra. "Mesmo aquelas leis que possuem um prazo acabam sendo alteradas para adiá-los. Casos recentes de mudanças nesse marco temporal incluem uma alteração na legislação federal em 2017 e em Roraima em 2019”, destaca.

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O relatório também aponta que a desorganização das bases de dados dos órgãos fundiários é uma das limitações para criar um ambiente de compartilhamento de dados entre instituições, o que poderia agilizar a análise de pedidos de titulação e dar maior transparência às informações fundiárias.

“Há vários estudos apontando que precisamos de um cadastro de terras unificado no Brasil para melhorar a gestão fundiária, e concordamos com essa sugestão. Porém, a situação que encontramos nos órgãos fundiários estaduais mostra que isso só ocorrerá se houver um investimento de médio prazo na organização e digitalização de suas bases de dados, para que as informações consigam ser compartilhadas”, destaca Brenda Brito.

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Os pesquisadores ainda ressaltam a alta expectativa de lucro com a invasão de terra pública devido ao baixo valor cobrado pelos governos na titulação de médios e grandes imóveis. Em média, o valor base cobrado pelos governos estaduais na venda de terra pública corresponde a apenas 15% do valor de mercado, com dispensa de licitação.

Já o governo federal cobra em média 26%. Além disso, sobre esse valor ainda podem incidir vários índices que reduzem ainda mais o preço final. Essa diferença entre o valor cobrado pelo governo e o valor de mercado representa um subsídio àqueles que ocupam terras públicas, aponta o estudo.

“Se a finalidade do governo é incentivar a produção sustentável, os subsídios aplicados no valor da terra deveriam ser substituídos por outros ligados ao uso do imóvel após titulação. Ou seja, cobrar valor de mercado na venda dos imóveis, mas conceder abatimentos nas parcelas anuais ou remunerar com esquemas de pagamentos por serviços ambientais se os titulados cumprirem o Código Florestal ou adotarem prática de agricultura de baixo carbono”, ressalta Brenda Brito.

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O relatório indica recomendações para que as legislações estaduais e a federal sejam revisadas e alteradas para se adequarem aos esforços de redução de desmatamento. Porém, Brenda destaca que um dos atuais projetos de lei que tramitam no Congresso para alterar a legislação fundiária vai na direção contrária.

“As alterações propostas no Projeto de Lei nº 2.633/2020 e no Projeto de Lei n.º 510/2021 podem reafirmar vários dos incentivos à grilagem que identificamos em nosso estudo, pois possuem brechas que podem permitir a titulação de terras públicas invadidas futuramente, não impedem a titulação de áreas recém-desmatadas e também afrouxam a cobrança de dívidas de quem já recebeu título e não pagou”, afirma.

Por isso, os autores sugerem que propostas de alterações na lei considerem aspectos como instituir procedimento transparente e com ampla consulta para destinação de terras públicas; proibir privatização de áreas predominantemente florestais; definir um marco temporal que limite a data de ocupação de terras públicas passíveis de titulação, para aquelas leis que não possuem essa previsão; e determinar valores de imóveis compatíveis com o mercado de terras na regularização por venda.

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Source: Rural

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