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(Foto: AFP)

 

Relatório da ONG internacional Global Witness divulgado nesta quarta-feira (2/12) aponta que as três maiores empresas de carne bovina do Brasil – JBS, Marfrig e Minerva – não conseguem evitar o envolvimento de suas cadeias produtivas com grandes áreas desmatadas na Amazônia.

A investigação afirma que, entre 2017 e 2019, apenas no Pará, JBS, Marfrig e Minerva compraram gado de 379 fazendas com mais de 20 mil campos de futebol de desmatamento ilegal, infringindo os termos de ajuste de conduta firmados com o Ministério Público Federal e suas obrigações legais.

Menciona, ainda, que avaliações feitas pelos auditores internacionais DNV-GL e Grant Thornton para monitorar o cumprimento dessas obrigações não foram capazes de identificar esses casos, mas foram usadas pelas empresas para dar um “verniz ecológico" em suas credenciais ambientais.

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O estudo também aponta que as gigantes da carne bovina falharam em monitorar mais de 4 mil fazendas no Pará inseridas em suas cadeias produtivas – com um total estimado de 140 mil campos de futebol de desmatamento – para evitar que gado dessas fazendas chegasse a seus frigoríficos.

Além disso, ressalta que JBS e Marfrig compraram gado de pecuaristas acusados pelo Ministério Público Federal de crimes como grilagem de terras e abusos de direitos humanos de povos indígenas e ativistas dos direitos à terra.

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De acordo com o levantamento, apesar dos registros, as indústrias foram "recompensadas" por grandes bancos da União Europeia e dos Estados Unidos, que financiaram as empresas de carne bovina em quase R$ 14 bilhões no período analisado.

O documento cita o nome de bancos como Santander, Deutsche Bank, Barclays, Morgan Stanley, BNP Paribas, ING e HSBC, indicando que eles "aparentemente falharam" em fazer a due diligence de seu envolvimento e continuam a apoiar as empresas de carne, apesar de muitos avisos sobre seus problemas.

Também há menções a grandes bancos brasileiros, como Bradesco e Banco do Brasil, que teriam liberado, segundo o estudo, mais de R$ 6 bilhões para as empresas no período.

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O relatório destaca ainda que, embora as três empresas tenham assumido o compromisso de eliminar o desmatamento na sua cadeia de fornecedores ao longo dos próximos anos, esse controle já deveria ter sido feito desde 2011, quando as três firmaram um novo acordo com o Greenpeace para tratar do problema.

No caso da JBS, a ONG aponta que o compromisso assumido este ano é "basicamente o reconhecimento de 14 anos de fracasso", e também questiona a viabilidade da metodologia anunciada pela Marfrig.

"Essas ferramentas são voluntárias e dependem da boa vontade dos fornecedores diretos. Elas não descrevem o que a Marfrig fará com essas informações para garantir que seus fornecedores indiretos com desmatamento sejam bloqueados", afirma o relatório.

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No caso da Minerva, a Global Witness ressalta que a empresa não possui sistemas ou controles que permitam o monitoramento da totalidade das compras de gado de fornecedores indiretos no bioma da Amazônia, o que "o arruína as alegações de responsabilidade ambiental" da empresa.

"Enquanto isso, bancos tradicionais e com compromissos de não desmatamento continuam apoiando essas empresas de carne bovina – apesar de vários avisos sobre seus problemas", critica a organização.

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“Nossa investigação demonstra claramente que um setor privado não regulamentado e com políticas voluntárias de não desmatamento não conseguiu lidar com a destruição da floresta e os abusos dos direitos humanos relacionados. Isso pode contribuir para a perda permanente da floresta amazônica”, diz Chris Moye, investigador sênior da Amazônia na Global Witness.

“Todos os envolvidos – fazendas que criam gado, gigantes da indústria da carne brasileira, auditores internacionais, financiadores tradicionais, supermercados, importadores e redes de fast-food – estão destruindo florestas tropicais, ou são cúmplices, com auditorias falhas realizadas por auditores americanos e europeus”, acrescenta.

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Moye também destaca que existem alternativas para mudar esse cenário. "Governos em todo o mundo devem tomar medidas e garantir que as empresas, incluindo bancos, sejam responsabilizadas por seu papel na destruição da Amazônia, exigindo due diligence obrigatória sobre riscos de desmatamento”, afirma.

Para fazer o estudo, a Global Witness afirma ter usado diversas técnicas investigativas, incluindo imagens de satélite, análise geoespacial, mineração de dados, documentos publicamente disponíveis e entrevistas com fontes.

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Pressão internacional

A Global Witness também afirma estar convocando países que importam, financiam ou investem em commodities de risco florestal, como a carne bovina brasileira, a aprovar leis exigindo que todas as empresas, incluindo instituições financeiras, identifiquem, previnam, mitiguem e relatem riscos de desmatamento e direitos humanos relacionados às florestas.

Também pede que JBS, Marfrig e Minerva adotem total transparência em suas cadeias produtivas, "a fim de permitir o escrutínio público das fazendas das quais essas empresas compram gado".

Outra cobrança é para o governo brasileiro. Para a ONG internacional, ele "deve assegurar que dados independentes e publicamente disponíveis que rastreiam o ciclo de vida do gado sejam facilmente acessíveis, como as guias de trânsito animal que mostram de quais fazendas as empresas de carne compram".

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Contrapontos

 

A Revista Globo Rural teve acesso ao relatório no fim da tarde desta quarta-feira (2/12) e entrou imediatamente em contato com as empresas citadas nesta reportagem. Até 13h30 desta quinta-feira (3/12), apenas Minerva, Marfrig, JBS e Santander responderam.

Em nota, a Minerva afirmou que realizou um levantamento detalhado "pixel a pixel" de cada uma das 16 fazendas citadas e não encontrou qualquer inconformidade alegada pela ONG.

"Nossa análise mostra que, em relação às 16 fazendas que o estudo relaciona à Minerva Foods, três delas nem sequer estão cadastradas no banco de dados da companhia e as outras 13 atendem integralmente aos critérios de sustentabilidade. Inclusive, a Minerva Foods não está vinculada a 379 fazendas, como também citado no estudo", diz a empresa.

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Em relação aos fornecedores indiretos, a Minerva destacou que os testes realizados com sua ferramenta de monitoramento mostram 99,9% de conformidade para as três unidades na região amazônica.

"A Minerva Foods apresenta os melhores resultados entre seus pares na auditoria do Ministério Público com o estado da arte em ferramentas de monitoramento geográfico. A empresa também não recebeu nenhum feedback da Global Witness sobre a análise entregue à ONG. Estamos confiantes nos resultados de nossa ferramenta de monitoramento geográfico – confirmados pelos resultados de auditoria do Ministério Público", conclui.

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Já a Marfrig esclareceu que desativou sua única unidade no Pará, localizada na cidade de Tucumã, em março deste ano e que, desde então, não compra mais gado de propriedades localizadas no Estado.

Segundo a empresa, não houve nenhum abate irregular por parte da Marfrig nos 89 casos indicados pela ONG e, em cinco deles, não foi possível identificar o produtor, uma vez que o número CAR (Cadastro Ambiental Rural) informado no relatório não correspondia a nenhuma fazenda presente no banco de dados da Marfrig.

"Os demais 84 casos foram rigorosamente avaliados e não foi identificado qualquer abate irregular, o que significa que eles estavam em conformidade com os critérios sociais e ambientais adotados pela Marfrig nas datas desses abates", afirma a empresa.

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A JBS, por sua vez, afirmou que os critérios adotados pela Global Witness nao são claros e que "identificou falhas na análise e reportou à própria Global Witness após uma revisão minuciosa sobre cada um dos 327 casos de desmatamento supostamente identificados".

Entre outros problemas, a empresa aponta que 40% dos casos apontados estavam em fase de regularização ambiental junto à Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará e outros 21% apresentam discrepâncias entre o mapa de propriedades apresentado pela Global Witness e o mapa monitorado pela JBS – o que pode ocorrer quando há um atraso entre a data de compra do gado e a data da verificação da ONG, explica a companhia.

"Fica claro, portanto, que a JBS apresentou análise técnica detalhada e justificativas para 100% dos casos apresentados pela Global Witness e que todas as compras mencionadas foram consideradas em conformidade com o Protocolo de Monitoramento de Fornecedores do MPF na época em que as transações foram realizadas pela JBS", defende a empresa.

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Ainda de acordo com a JBS, o Protocolo de Monitoramento de Fornecedores do MPF utilizado para bloquear ou desbloquear fornecedores usam critérios técnicos e que as análises realizadas sem observar taus as normas técnicas podem levar a resultados errôneos, "como no caso da investigação conduzida pela Global Witness". 

"Por tudo isso, podemos assegurar que a JBS não comprou gado de fazendas embargadas por irregularidades ambientais ou em desacordo com o Protocolo de Monitoramento de Fornecedores do MPF", explica a JBS

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Em nota, o Santander afirmou que realiza, anualmente, a reavaliação de sua carteira de clientes corporativos sob critérios socioambientais e que utiliza um serviço de monitoramento por satélite que faz a cobertura de cerca de 5 mil propriedades rurais que receberam financiamento ou foram dadas em garantia.

Entre os critérios para avaliação, está o cumprimento dos acordos firmados com o Ministério Público Federal e o Greenpeace para garantir a procedência dos animais adquiridos na região amazônica. "O Santander esclarece que atuou e segue atuando em conformidade com a regulamentação aplicável e adota as melhores práticas socioambientais.".

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No relatório, a Global Witness menciona que as empresas de carne bovina alegaram que as guias de transporte animal, que detalham a origem do gado que compram, não são documentos disponíveis ao público e, por isso, não conseguem monitorar o movimento do gado ao longo da cadeia produtiva para ver se provêm de fazendas com desmatamento.

Em suas respostas aos pedidos feitos pela Global Witness para comentar, DNV-GL e Grant Thornton alegaram que restrições às auditorias podem tê-las impedido de identificar os casos encontrados. Questionados pela ONG, todos os bancos mencionados defenderam seu relacionamento com as empresas de carne, segundo a Global Witness.
Source: Rural

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