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Mercado americano de cannabis legalizada se fortalece e movimenta bilhões de dólares (Foto: Getty Images)

 

O lendário sambista Bezerra da Silva alertava que para “fazer a cabeça tem hora”. E essa hora pode ter chegado definitivamente nos Estados Unidos. O país vive um avanço nos negócios baseados na cannabis, que tem chamado a atenção de celebridades do país. Os rappers Jay-Z, Drake e Snoop Dog, o guitarrista Carlos Santana, o ex-jogador da NBA Shawn Kemp e as atrizes Whoopi Goldberg e Gwyneth Paltrow estão entre os que lançaram produtos relacionados ao “mato forte”, como a maconha era conhecida na década de 1970 no País.

Um novo impulso pode vir do resultado das eleições americanas. Em outubro, no debate entre candidatos a vice-presidência dos Estados Unidos, Kamala Harris, do Partido Democrata, defendeu a legalização da cannabis. Após a declaração, no dia 8 de outubro, ações de companhias do setor dispararam. A canadense Tilray, com papeis negociados na Nasdaq, alcançou 18,2% de valorização. 

E, com as projeções por parte da imprensa americana de resultados a favor da chapa Biden-Harris contra Donald Trump, houve novo dia de valorização, na segunda-feira (9/11). Os papéis da Aurora Cannabis tiveram alta de 14,5%. Esse movimento de alta na Bolsa de Nova York, em alguns casos, teve respaldo também na divulgação de resultados financeiros positivos de empresas do setor.

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Além do resultado favorável à chapa democrata, a expectativa positiva é reforçada pelo aumento da legalização da erva em âmbito estadual nos Estados Unidos. Nova Jersey, Dakota do Sul, Montana e Arizona se somaram a outros 11 Estados que permitem o uso recreativo da maconha. E Mississipi e Dakota do Sul ainda liberaram o uso medicinal, elevando para 35 o número de Estados com uso terapêutico da planta.

“Temos uma visão bem positiva desse mercado”, afirma Enzo Pacheco, editor-assistente da Empiricus, que atua em uma publicação da empresa que avalia diversos ativos internacionais, entre eles, o mercado norte-americano de cannabis desde 2018.

Apesar da valorização das empresas e o glamour que as celebridades estão emprestando à cannabis, o ambiente de investimento ainda é complexo. No Congresso dos Estados Unidos, tramitam projetos para descriminalizar o uso da maconha em nível federal e para regulamentar a atuação do setor financeiro no comércio de produtos à base da planta.

Sem aprovação federal, os chamados depositários, como são conhecidas as lojas de maconha, não têm acesso a serviços bancários nem podem pensar em abrir capital na bolsa de valores americana, mesmo nos estados a erva está legalizada, explica Pacheco. E os clientes não podem usar cartão de débito ou crédito para realizar suas compras nos Estados Unidos: ou é dinheiro ou cartão pré-pago. A depender da configuração do Congresso americano resultante das eleições de novembro, esses projetos podem enfrentar mais ou menos resistência.

No Canadá

A falta de aprovação federal ao segmento nos Estados Unidos levou empresas a abrirem capital na Bolsa do Canadá. Segundo Enzo Pacheco, da Empiricus, das 600 empresas listadas na Canadian Stock Exchange, 203 são do setor de cannabis, muitas dos Estados Unidos.

Já as canadenses, mesmo com aval do governo local – que veio apenas em 2018 – seguiram o caminho inverso, rumo à bolsa americana. Caso da Cronos Group, que ainda recebeu investimentos da ordem de US$ 2 bilhões. A Canopy Growth, também canadense, recebeu nada menos que US$ 4 bilhões em aportes.

O editor-assistente da Empiricus explica que, apesar de não haver uma regulamentação federal nos Estados Unidos, empresas estrangeiras do setor podem abrir capital na bolsa americana. E investidores estrangeiros podem comprar comprarem ações dessas companhias bolsa mesmo que haja uma regulamentação local de mercado, como no Brasil.

Segundo Enzo Pacheco, as empresas canandenses buscaram o mercado de capitais americano pelo fato de concentrar investidores mundiais, enquanto a bolsa do Canadá não tem essa característica global. Mas isso gera certa distorção no mercado, uma vez que as empresas americanas de cannabis têm resultados melhores que as canadenses. E a bolsa canadense é restritiva à atuação de grandes fundos de investimento, além de ter menor liquidez que a bolsa americana.

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No segundo trimestre de 2020, a americana Curaleaf obteve receita de US$ 117,5 milhões, crescimento de 142% em relação ao mesmo período do ano passado. A Trulieve contabilizou US$ 120,7 milhões entre abril e junho deste ano, 191,5% a mais na mesma comparação. Já a canadense Aurora Cannabis, por exemplo, apresentou receita líquida de US$ 72,1 milhões no quarto trimestre fiscal (equivalente ao 2º trimestre). No mesmo período em 2019, a companhia registrou US$ 98,9 milhões.

“As americanas estão com operação mais redonda que as canadenses”, diz Pacheco. E a escala de consumidores é também muito maior, destaca. No ano passado, a estimativa é que o mercado canadense tenha movimentado US$ 2 bilhões. “Só a Califórnia em 2019, sozinha, movimentou US$ 3 bilhões”, explica.

Dados publicados pela imprensa americana reforçam a expectativa de crescimento. A consultoria New Frontier Data avalia que o mercado dos Estados Unidos e do Canadá tenha movimentado US$ 16 bilhões no ano passado, contra US$ 10 bilhões em 2018. Até 2025, analistas como a Cowen Investimentos, projetam um mercado de US$ 34 bilhões nos Estados Unidos.

Celebridades

Alberto Amparo, especialista da Suno que avalia investimentos em diversos tipos de ativos estrangeiros, entre eles empresas de cannabis, avalia que a vitória de Joe Biden dará um impulso maior ao mercado legalizado da erva recreativa. “O mercado ilícito nos Estados Unidos é ainda imenso”, explica. 

Pesquisa da Euromonitor International, divulgada na terça-feira (10/11), avalia que as vendas de cannabis recreativa devem aumentar em 376% as vendas em nível global nos próximos cinco anos. Com esse impulso, a expectativa é de que, até 2025, as vendas desse segmento representem 67% do total. Já o mercado de cannabis medicinal deve ver sua participação cair para 9% do comércio mundial.

É nesse sentido que entra a importância das celebridades, explica Amparo, para colocar o produto em uma posição de destaque. “No final das contas, é uma commodity. Não há diferenciação no produto. Se investir, a qualidade será muito próxima (da loja ao lado)”, explica.

E esse processo de diferenciação passa também pela atuação individual das companhias. “O sucesso do setor é como sucesso de empresas individuais. Quando surgiram companhias áreas elas vieram para mudar, mas surgiram muitas companhias e não tinha evidenciais para distinguir quais das companhias teriam sucesso. E como investir nisso? É muito difícil decidir qual empresa vai ter sucesso.”

Negócios sociais

Na América do Sul, o Uruguai legalizou o mercado de cannabis, onde o governo é o responsável pela produção, embora esteja estimulando a exportação da erva por empresas privadas. O Brasil ainda restringe à venda do canabidiol, usado no tratamento de doenças como epilepsia, microcefalia, esclerose múltipla e Alzheimer. 

Mas Cassiano Teixeira, diretor-executivo e fundador da Associação Brasileira de Apoio Cannabis Esperança (Abrace Esperança), de João Pessoa (PB), explica que está sendo criado algo muito diferente no Brasil: negócios sociais da cannabis.

A Abrace obteve autorização da Justiça para plantar e extrair o óleo, vendido no Brasil a R$ 79 o frasco de 30 ml, enquanto os importados ultrapassam R$ 2 mil. Em 2018, a entidade tinha cerca de 600 associados. Hoje, somam 11 mil. Em 2021, a Abrace começará a vender o seu óleo para clientes nas cidades de São Paulo e Campinas.

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“Temos 4 mil associados em São Paulo. E eles merecem um atendimento de mais qualidade, mais seguro e mais barato. Estão sendo criadas 37 associações em todo o País e não vemos o associado como cliente. O Brasil está se diferenciando com soluções sociais, mais democráticas e de baixo de custo”, afirma ele, que comanda dois dispensários em João Pessoa e Campina Grande que tem um total de dez mil plantas sendo cultivadas.

As novas associações, no entanto, não têm a autorização judicial para trabalhar, como a Abrace conseguiu. Por aqui, o setor depende da aprovação do Projeto de Lei 399/2015, que legaliza o cultivo medicinal da cannabis. Para o diretor da Abrace, após as eleições municipais, há grande expectativa que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), coloque esse projeto na pauta da Câmara dos Deputados.

O texto está na Comissão Especial da Câmara. Enquanto não há uma aprovação e, mesmo entendendo que esses participantes estão sujeitos a serem acusados de crimes, Teixeira argumenta que é preciso se arriscar quando a vida está em jogo. “Ninguém vai ficar esperando nem de governo e nem de (remédio) importado”, diz.
Source: Rural

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