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(Foto: AFP)

 

A baixa disponibilidade de gado no Brasil devido ao ciclo de alta pecuária tem um agravante no Mato Grosso, maior produtor nacional de carne bovina.

Com as grandes empresas do setor aumentando o compromisso com o desmatamento zero na Amazônia e estendendo-o a seus fornecedores indiretos, muitos pecuaristas têm aproveitado a isenção fiscal para movimentação interestadual do rebanho a propriedades de mesma titularidade para abater os animais em frigoríficos sem controle sobre o histórico ambiental dos fornecedores.

 

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“A gente tem visto um crescimento muito grande dessa evasão de animais e alertamos os dois pontos: a questão tributária e a ilegalidade ambiental. As duas contribuem para essa evasão”, destaca o presidente do Sindicato das Indústrias de Frigoríficos do Estado de Mato Grosso (Sindifrigo-MT), Paulo Bellicanta.

Segundo ele, cerca da metade dos 93 mil animais que saíram do Estado em agosto deste ano são oriundos do norte do Mato Grosso, onde predomina o bioma amazônico e as empresas locais são signatárias de um Termo de Ajustamento de Conduta comprometendo-se a não adquirir animais de áreas com passivo ambiental.

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“Esse gado está morrendo fora do Mato Grosso, fora da região, sem nenhuma comprovação de que ele não seja fruto de área ilegal”, aponta Bellicanta, ao reforçar seu apoio às medidas de sustentabilidade adotadas pelo setor no Estado.

“Entendemos que é assim que deve ser porque assim vamos conseguir ter uma Amazônia respeitada no resto do mundo, respeitando a lei. O problema é que encontraram uma saída para burlar isso enquanto são feitas vistas grossas por algumas empresas compradoras”, critica o presidente do Sindifrigo-MT.

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A evasão de animais do Mato Grosso coincide não só com o aumento das exigências ambientais de grandes frigoríficos, mas também com mudanças na tributação na circulação de mercadorias entre propriedades de mesmo dono.

Em agosto deste ano, o plenário do  Supremo Tribunal Federal confirmou o entendimento de que a cobrança do ICMS só se aplica nos casos em que a circulação de mercadoria entre Estados configurar ato mercantil ou transferência da titularidade do bem. Com isso, os pecuaristas do MT têm transferido os animais livre de impostos para serem abatidos próximos dos principais mercados consumidores do país e dos canais de exportação.

Está se usando, neste momento, uma brecha da lei para uma comercialização ilegal, e isso é uma coisa muito complicada para quem está no Mato Grosso. Quem está no MT paga imposto para matar boi, tem tributo sobre a carne, e quem está em São Paulo não tem. Isso gera desigualdades de competição econômica

Paulo Bellicanta, presidente do Sindifrigo-MT

 

Lavagem de gado

Chamada de “lavagem de gado”, a prática é comum e tende a aumentar diante da falta de uma política nacional de combate ao desmatamento ilegal, observa o diretor executivo da ONG Amigos da Terra, Mauro Armelin.

“O TAC da Amazônia vale para a Amazônia como um todo. Porém, as auditorias são realizadas pelo Ministério Público Federal de cada Estado. Por enquanto, só o Estado do Pará tem feito essas auditorias”, afirma Armelin.

As auditorias, contudo, não analisam o gado abatido em empresas fora do bioma, que recebem esses animais livre de impostos desde agosto. “A conduta ruim do frigorífico no Estado de São Paulo não é com relação aos animais que são criados no Estado de São Paulo, mas àqueles que estão vindo de áreas onde não são abatidos porque os frigoríficos estão prestando atenção nas questões legais da origem do gado”, aponta o ambientalista.

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O assessor técnico da Comissão Nacional de Bovinocultura de Corte da CNA, Ricardo Nissen, reconhece que o problema existe no Mato Grosso e ressalta que, muitas vezes, os produtores têm dificuldades de regularizar sua atividade.

“Muitas vezes o produtor quer estar legal, e isso está travado dentro dos órgão reguladores. Tem produtores altamente tecnificados e produtivos e quem nem o Cadastro AMbiental Rural consegue fazer”, afirma Nissen, ao contemporizar as críticas feitas pela indústria mato-grossense à evasão de gado no Estado.

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“Acho que é muito uma questão de oferta e demanda. A partir do momento que a indústria começar a sentir uma queda de oferta, eles possivelmente vão aumentar os preços, reduzindo os diferenciais entre Mato Grosso e São Paulo”, aponta o assessor técnico da CNA.

Sem uma solução efetiva para o problema, contudo, Bellicanta avalia ser difícil que as medidas de proteção à Amazônia surtam efeito no Estado. “Depois que o produtor descobre que tem uma forma de continuar ilegal sem efeitos sobre ele, tanto faz para ele estar legal ou não, desmatar ou não, já que encontrou uma saída”, diz o presidente do Sindifrigo-MT.
Source: Rural

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