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(Foto: Bárbara Pachêco)

 

Os desafios para recuperação de vegetação nativa nas propriedades do país são diversos, assim como os ganhos ambientais associados. A obrigação legal é o principal estímulo para produtores rurais se envolverem em recuperação, mas seu pleno atendimento apresenta muitas dificuldades.

Quando o Grupo Agropecuária Fazenda Brasil (AFB) comprou propriedades rurais, junto com elas herdou passivos ambientais em áreas de APPs. O Grupo AFB tem 8 fazendas em Mato Grosso e uma no Rio de Janeiro, totalizando 85 mil ha. Em 2010, foi feito levantamento do tamanho do problema: mais de 700 hectares de APP a serem recuperados.

Uma das primeiras iniciativas foi montar um viveiro, mas a capacidade de recuperação florestal usando mudas não conseguia cumprir os termos de ajuste de conduta (TAC). Foi nessa época que o grupo conheceu e abriu as portas para o Instituto Socioambiental (ISA) para a implantação de áreas experimentais de recuperação florestal com um novo método, conhecido como “muvuca de sementes”, tecnicamente chamado de semeadura direta.

Esse método de recomposição da vegetação promove uma formação ecológica mais semelhante à vegetação original com o plantio de sementes em alta densidade, fazendo com que uma estrutura florestal se forme rapidamente.

A mistura de sementes inclui espécies de leguminosas de ciclo de vida curto, utilizadas como adubação verde, como crotalária e feijão-guandu; árvores de crescimento rápido para dominar o dossel; e árvores nativas de crescimento lento. A predominância é de espécies com sementes ortodoxas de fácil armazenamento.

Diversos projetos de restauração utilizando semeadura direta demonstram que ela pode custar até três vezes menos do que o plantio de mudas. Outros diferenciais é que se pode usar o método em praticamente qualquer condição de declividade, solo ou tamanho de propriedade, de forma mecanizada ou manual.

Bom preparo do solo é fundamental, assim como manutenção. Além disso, o método atende os resultados dos principais indicadores ecológicos de cobertura de solo, densidade e riqueza exigidos por legislações. O método requer grande quantidade de semente, que no caso vieram da Rede de Sementes do Xingu, pioneira nesta produção.

Assim, foram implantados pequenos fragmentos de recuperação para avaliar o método. Começou aí uma parceria de sucesso e desde então o Grupo AFB já recuperou mais de 700 hectares. Interessante destacar que houve uma evolução no desenvolvimento das técnicas de plantio, de maneira que se chegou em um formato ideal para as condições do Grupo.

No início, a indicação do ISA era usar plantadeira, o que foi difícil, pois coincidia com o plantio da soja. O ISA propôs então utilizar o vincon (adubadora), mas que também apresentou alguns desafios. Desta forma, depois de alguns testes, em 2014, usamos uma outra técnica, o lançamento manual das sementes em carretinha puxada por trator.

A semeadura direta demonstrou ser uma opção viável devido ao baixo investimento: para recuperar 700 hectares de APP, foi investido cerca de R$ 1,4 milhão, 20% do valor para recuperar mesma área com o plantio de mudas. Este aspecto de adaptabilidade, em que foi possível alterar a ‘receita’ originalmente apresentada pelo ISA, foi fundamental para sucesso do programa de restauração da AFB.

Em 2013 foi desativado o viveiro e a recuperação por mudas, pois verificou-se que as áreas amostrais de ‘muvuca’ estavam indo melhor. Além do custo, outro motivo pela preferência por sementes foi a diversidade de espécies.

Foi um trabalho em conjunto que rendeu não só a recuperação de áreas nativas, mas uma forte parceria entre o Grupo AFB, ISA e Rede de Sementes do Xingu.

Este caso ilustra bem como o método da semeadura direta pode auxiliar produtores que têm passivos ambientais. Com informação e acesso a métodos de baixo custo, parcerias e equipe interna comprometida, as propriedades rurais podem se adequar a legislação de maneira eficiente, gerando serviços ambientais para a sociedade e para sua própria produção.

Com objetivo de dar escala a este tipo de parceria, ISA e Agroicone lançaram em 2019 a Iniciativa Caminhos da Semente, que promove a restauração ecológica por meio da difusão do método da semeadura direta. A Iniciativa trabalha de forma colaborativa com uma rede de parceiros de diversos setores, provendo assistência técnica e capacitação para diferentes públicos.

A experiência do Grupo AFB alcançou três grandes resultados: parceria estratégica, aproximando setores que antes não conversavam, ganho ambiental da recuperação de florestas, e produção agrícola em conformidade com legislação ambiental. Um caminho para que muitos outros agricultores se inspirem.

* Artemizia Moita, gerente do setor ambiental do grupo AFB (Agropecuária Fazenda Brasil); Eduardo Malta, especialista em restauração ecológica do Instituto Socioambiental e Associação Rede de Sementes do Xingu; e Laura Antoniazzi, pesquisadora sênior da Agroicone e coordenadora geral da Iniciativa Caminhos da Semente.

As ideias e opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do seu autor e não representam necessariamente o posicionamento editorial da revista Globo Rural
Source: Rural

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