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Pantaneiros tentam conter fogo na Fazenda Panthera Brasil, na região de Jofre Velho, em Poconé (MT) (Foto: Zé Medeiros/Globo Rural)

 

O pantaneiro é acostumado a pegar no pesado, mas não com isso”, diz o motorista de 60 anos Antônio José ao falar sobre o ritmo de trabalho adotado desde agosto por ele e por seu colega, o guia Antônio Abelardo, de 53 anos.

Há mais de 24 horas sem dormir, os dois pantaneiros são exemplos dos inúmeros pantaneiros atingidos pelas chamas que chegam a mais de 25 metros de altura na vegetação das pousadas, dos parques e das fazendas do Pantanal.

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A equipe de reportagem da Revista Globo Rural chegou à região nesta sexta-feira (11/9) para acompanhar os esforços de combate ao fogo no bioma, resgate de animais e os impactos sobre a produção agropecuária local.

“Trabalhamos a noite toda para apagar um fogo em uma pousada aqui da região e pela manhã viemos para cá, pegamos direto, sem parar”, diz Antônio Abelardo, conhecido como Toni. O novo normal de Toni e Antônio são horizontes esfumaçados, o brilhos vermelhos do fogo na beira da estrada, corixos secos, animais incinerados e pontes queimadas.

Pantaneiros Toni (E) e Antônio José jantam dentror do carro às margens da transpantaneira (Foto: Zé Medeiros/Globo Rural)

 

 

Imagens que repetem-se pelos mais de 280 quilômetros rodados pela reportagem, que saiu de Cuiabá na quinta-feira (10/9). Neste ambiente hostil, o trabalho da dupla de pantaneiros é quase uma gota d’água em um pantanal de fogo. Estacionados na beira da Transpantaneira, os dois carregam duas caixas d’água container de 1 mil litros cada na carroceria de madeira de uma velha caminhonete. A ideia é monitorar o fogo para evitar que as pontes da Transpantaneira sejam queimadas.

“Não imaginamos isso nem nos nossos piores pesadelos, o fogo destruiu tudo porque este ano não choveu, ano passado também não choveu, o Pantanal não transbordou”, diz Toni. Seu parceiro Antônio, sete anos mais experiente, completa: “Lugares que antes se enchiam de água este ano simplesmente não alagou”. 

Chamas se espalham nas margens da Transpantaneira, em Poconé (MT) (Foto: Zé Medeiros/Globo Rural)

 

Queimou em todo lugar. Não tem um lugar que não tenha sido queimado, alguns com menos proporções porque o campo estava mais limpo. O que aconteceu é uma vergonha em termos governamentais"

Antônio Abelardo (Toni), guia

O fogo no Pantanal virou, ao longo dos últimos 30 dias, uma espécie de sujeito e não mais um fenômeno. Os verbos são regidos pela ação das chamas e quase tudo o que acontece é em função dele. Diz-se com naturalidade que o “fogo destruiu”, o “fogo pulou a estrada”, “o fogo fez isso”, “o fogo fez aquilo”…

Os pantaneiros, que antes eram íntimos das águas, acostumam-se pouco a pouco com a presença do fogo. Foi o que aconteceu com o pantaneiro Elizeu Evangelista, de 53 anos, que gerencia a fazenda Panthera Brasil, de propriedade da ONG de mesmo nome. Elizeu também transformou-se, por conta da presença das chamas, em uma espécie de vigilante do fogo.

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Submetido a uma rotina exaustiva e abrasiva, ele sai todas as noites para monitorar o incêndio recém controlado na fazenda de 10 mil hectares dedicada a preservação de onças-pintadas. “Essa coisa de não dormir já virou rotina para mim, não é mais nenhuma novidade”, diz durante intervalo para jantar no refeitório da fazenda da ONG, quando o relógio já marcava 21h36.

Rafael Hoogesteijn, supervisor da ONG, é o segundo a chegar no refeitório. “Estou cansado”, suspira o venezuelano de 66 anos, conhecido por ser um dos maiores especialistas no manejo de onça-pintada no mundo. “Se não está cansado é melhor nem ir”, brinca Elizeu. “Não, vamos, já estou pronto”, responde Rafael, com ar disposto.

Apesar do cansaço, trabalho segue à noite para evitar retomada das chamas (Foto: Zé Medeiros/Globo Rural)

 

Em poucos minutos, Elizeu e Rafael saem novamente para o monitoramento. Graças a este trabalho feito em conjunto com o Corpo de Bombeiros, a frente de combate ao incêndio florestal da fazenda Panthera é conhecida por ter vencido o fogo com maior eficiência até aqui. Em outras regiões, como no Parque Estadual Encontro das Águas as chamas já destruíram praticamente toda a vegetação.

“Vencemos pequenas batalhas, mas não a guerra, não dá pra dizer que vencemos, não dá pra vacilar porque o fogo logo arrebenta tudo de novo”, conta Elizeu. A vigília não é uma preocupação exagerada.

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Fogo subterrâneo

 

Vídeo: ICMBio/Divulgação

No Pantanal, existe o chamado “fogo subterrâneo”, um tipo de queima que ocorre no subsolo que normalmente é alagado, mas que por conta da vegetação seca torna-se um esconderijo de pequenos focos. 

O grupo sai todas as noites em uma caminhonete quatro por quatro, que leva um tambor de 500 litros de água retirada dos corixos para apagar alguns focos pequenos no meio do Pantanal seco.

Mais de cinco focos foram encontrados em pouco mais de duas horas de ronda pela mata. Quando esquecido, estas pequenas chamas se alastram no decorrer do dia e, muitas vezes, até terrenos que já foram incinerados voltam a ser queimados.
Source: Rural

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