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(Foto: Rogério Albuquerque/Ed. Globo)

 

Nesta semana, o secretário de Agricultura e Abastecimento de São Paulo (SAA), Gustavo Junqueira, reuniu-se com produtores rurais e representantes do setor na cidade de Mogi das Cruzes, que é um dos principais hubs de produção de frutas, legumes e verduras (FLV) do Estado, para anunciar mudanças na estrutura da SAA.

Entre as novidades, que devem ser implantadas definitivamente dentro de um ano, uma informação causou apreensão no setor: o fechamento das 574 Casas da Agricultura e o fim do Itesp (Instituto de Terras de São Paulo).

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“Não vamos fechar as Casas da Agricultura, mas reorganizar a estrutura para que ela passe a funcionar de acordo com as demandas atuais dos produtores do Estado”, afirmou Junqueira à Globo Rural.

Na manhã desta sexta-feira (04/9), a Associação Paulista de Extensão Rural (APAER) anunciou que vai recorrer ao Ministério Público de São Paulo para impedir as mudanças e ter acesso ao plano do Estado.

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“O fechamento das Casas da Agricultura vai atingir diretamente cerca de 300 mil agricultores familiares que recebem orientação dos extensionistas que atuam no meio rural, comprometendo o desempenho dessas pequenas propriedades, prejudicando e encarecendo a produção de alimentos essenciais para nossa sociedade como leite, frutas, ovos e hortaliças", afirmou o presidente da entidade, Antônio Marchiori, em uma nota dirigida à imprensa.

Para Junqueira, é normal que as entidades queiram saber mais sobre a reestruturação. “A última reforma administrativa que a SAA realizou foi em 1993, uma época em que não existia telefone celular, a economia era outra, a moeda era outra. Havia 10 mil funcionários atuando na secretaria e ninguém nem sabia o que era a internet”, justificou. “O que precisamos fazer é trazer toda esta estrutura analógica para o mundo atual, digital, sem perder o foco no desenvolvimento do agronegócio paulista”.

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Confira, a seguir, a entrevista:

Globo Rural – Quais são os planos do Estado e da Secretária de Agricultura e Abastecimento (SAA)?
Gustavo Junqueira – A Secretaria de Agricultura e Abastecimento teve a sua última reforma em 1993, durante a gestão do então secretario Barros Munhoz, uma época totalmente diferente da que vivemos hoje. As demandas eram outras, a economia era outra. Era um período em que o Brasil colhia uma safra de 68 milhões de toneladas de grãos, não havia internet, nem o Plano Real. Hoje, o mundo é outro, nossa safra é de 250 milhões de toneladas, temos a internet, rodovias, tecnologias, e as demandas do produtor rural são outras. Então, a secretaria tem que acompanhar este mundo atual, sair do analógico e vir para o digital. Desde dezembro de 2018, estamos estudando a reestruturação da SAA junto a uma consultoria especializada.

GR – E como será realizada a reestruturação da SAA? Em quanto tempo São Paulo implantará as mudanças?
Junqueira – Esta reestruturação é estratégica e tem como foco o produtor rural, mas principalmente, os produtores independentes, que não têm a sua atividade ligada à agroindústria, que é um setor muito desenvolvido no nosso Estado. Os produtores ligados à agroindústria estão bem assistidos pela iniciativa privada, mas os pequenos precisam de atenção do Estado. A reestruturação inclui uma consolidação administrativa, que vai ser centralizar os serviços administrativos como compras e contratos, recursos humanos e tecnologia de informação (TI) e a criação de três subsecretarias, divididas em Abastecimento e Segurança Alimentar, Pesquisa e Inovação, e Desenvolvimento Rural e Defesa Agropecuária. Nós precisamos desburocratizar o sistema e reorganizá-lo para que a assistência rural possa atuar diretamente no campo, e não no trabalho burocrático de um escritório. A partir da assinatura do decreto pelo governador João Doria (do projeto de lei 529/2020, que estabelece ajustes fiscais e equilíbrio de contas públicas), em um ano, poderemos implantar a reestruturação.

Um dos nossos objetivos principais é privatizar a Ceagesp para retomar o controle do abastecimento no Estado de São Paulo. Hoje estamos vendo os preços dos alimentos subirem e não temos como justificar essas altas para os consumidores paulistas

 

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GR – Qual será a atribuição da subsecretaria do Abastecimento e Segurança Alimentar e o que as mudanças podem trazer para a agricultura paulista?
Junqueira – A subsecretaria de Abastecimento e Segurança Alimentar inclui a gestão da distribuição e a fiscalização. Um dos nossos objetivos principais é privatizar a Ceagesp para retomar o controle do abastecimento no Estado de São Paulo. No passado [em 1997, durante o governo Mario Covas], houve uma negociação que envolveu a Ceagesp, Fepasa, Eletropaulo e o Banespa. As ações da Ceagesp (cerca de R$ 250 milhões) passaram à União e a única forma de o Estado de São Paulo recuperar o abastecimento é privatizar a Ceagesp. Para se ter um exemplo, hoje estamos vendo os preços dos alimentos subirem e não temos como justificar essas altas para os consumidores paulistas. Não temos razão para isso.

GR – E as demais subsecretarias, como a reestruturação vai alterar o trabalho que já vinha sendo feito anteriormente?
Junqueira – A subsecretaria de Pesquisa e Inovação vai reunir os seis institutos estaduais que já existem. Estes institutos têm que conversar entre si para levar soluções para o campo, para os produtores de São Paulo. Existem hoje mais de 1.000 projetos científicos sem foco, sem solução por falta de comunicação entre os institutos. São Paulo tem cerca de 500 pesquisadores e grandes projetos, mas estes projetos precisam sair dos laboratórios e chegar ao campo. A subsecretaria da Pesquisa precisa transferir a tecnologia, identificar soluções viáveis e aplicáveis para os produtores de cada região, atender a demanda real deles. Já temos um planejamento para esta subsecretaria com 13 linhas de pesquisa voltadas para as áreas de cana-de-açúcar, citrus, amendoim, pecuária, itens de valor agregado, novas tecnologias, entre outros. O Estado de São Paulo é uma região onde a agroindústria é fortíssima, existem projetos e tecnologias muito bons para o campo, mas eles precisam chegar, de fato, aos produtores rurais.

 

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GR – A área de pesquisa e inovação terá incentivos do governo?
Junqueira – Uma das grandes mudanças que queremos fazer nesta fase de modernização é criar um Fundo de Endowment (Fundo Patrimonial), a exemplo dos modelos da Universidade de Harvard, Yale e Queenstown. Será um grande passo para o agronegócio brasileiro. Sem exagero, digo que será o passo mais importante desde a criação da Embrapa. O endowment tem como objetivo gerir um patrimônio de duração perpétua e os seus rendimentos extras que são utilizados para investimentos e a expansão da pesquisa científica. São fundos advindos de doações de pessoas físicas ou empresas. Hoje, no Estado, temos muita pesquisa sendo realizada em áreas comerciais, em parcerias com as agroindústrias e temos um patrimônio imobiliário muito grande que pode ser convertido ao fundo e revertido para a pesquisa científica. Para se ter uma ideia, dentro da cidade de Campinas, temos uma fazenda com mais de mil hectares. O fundo será uma grande transformação da agricultura paulista e um exemplo para o Brasil.

GR – E a subsecretaria de Desenvolvimento Rural e Defesa?
Junqueira – Esta subsecretaria vai dar uma visão geral de gestão para o produtor rural, o que inclui gestão financeira, ambiental, agronômica. O programa Mais Gestão Mais Renda está dentro desta subsecretaria, e o foco é munir o produtor, principalmente os pequenos e independentes, de informação e orientação técnica. A extensão rural entra aí: o técnico agropecuário não tem que ficar preenchendo papel na casa de agricultura, ele tem que ir para o campo, orientar o produtor. Hoje, como está, não está funcionando. Os técnicos não têm nem carros para chegar ao produtor. Identificamos uma frota de 2 mil veículos velhos, de 12 anos em média, e vamos vender, comprar veículos novos em número suficiente para atender cerca de 100 mil propriedades rurais de pequenos agricultores. Eles precisam de um tablet, um computador e um carro.

 

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GR – Aí entra a questão do fechamento das Casas da Agricultura?
Junqueira – Não vamos fechar as Casas da Agricultura, vamos abrir os serviços a que elas se prestam, mas não se trata de um prédio, um local físico. Essa é a verdade. Atualmente, temos imóveis ocupados por um ou dois funcionários que ficam batendo carimbo, apenas 40% das Casas da Agricultura tem mais de dois funcionários, não temos que gastar com isso, mas investir em assistência real, atender o produtor rural do Estado, principalmente os pequenos. Hoje, no Estado, existem 594 Casas da Agricultura, das quais 240 estão abertas, mais 40 escritórios regionais e 40 escritórios de extensão rural. Por que estamos mantendo toda esta estrutura se podemos reorganizar para que funcione? O Estado investiu no Gedave (plataforma digital para Gestão de Defesa Animal e Vegetal) que vai incorporar essas demandas.

GR – Mas não haverá nenhum local de atendimento presencial para os produtores rurais?
Junqueira –  Vamos estudar cada região e elaborar planos para cada uma delas, de acordo com a demanda. Pode ser que mantenhamos as Casas da Agricultura em algumas regiões, não vamos fechar todas, elas ainda têm um papel importante para o produtor, mas, em outras, podemos trabalhar em parcerias com as prefeituras e as cooperativas, a exemplo do que já ocorre em Estados como o Paraná. São Paulo não pode ficar tão atrás. Não vamos acabar com o atendimento presencial ao produtor.

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GR – O senhor acredita que os produtores rurais, incluindo os pequenos, já estão prontos para os serviços digitais?
Junqueira – Sim, e se houver problema de cobertura de internet no Estado, esse é outro problema que o Estado precisa resolver junto às operadoras. Nós vivemos em um mundo digital e a pandemia também nos mostrou que muita coisa pode funcionar virtualmente. Alguns processos das Casas da Agricultura, como a emissão das GTAs (Guia de Transito Animal), Permissão de Transporte Vegetal, comprovantes sanitários, entre outros, já são emitidos virtualmente há alguns anos. O produtor não precisa gastar tempo e dinheiro indo até uma Casa de Agricultura quando pode fazer isso pelo celular ou pelo computador.

GR – A reestruturação inclui transferir para a SAA a responsabilidade ambiental das propriedades rurais?
Junqueira – Sim. Toda a responsabilidade ambiental das propriedades privadas no Estado de São Paulo é de responsabilidade da Secretaria de Agricultura e não mais da Secretaria de Meio Ambiente (SMA). A gestão ambiental das propriedades é nossa responsabilidade, não podemos permitir a criação de um passivo ambiental no Estado de São Paulo. E hoje em dia, não enxergar o meio ambiente como parte do negócio rural é inviável. São atividades que se completam. As Unidades de Conservação do Estado continuam sob a responsabilidade da SMA. Nas próximas semanas, teremos anúncios importantes na área ambiental.

GR – A reestruturação da SAA implica no fim do Itesp (Instituto de Terras de São Paulo)?
Junqueira – Não, o Itesp vai se adequar ao mesmo modelo de gestão, deburocratizado. Na nossa visão, não faz diferença se o pequeno produtor tem quatro hectares de terras em uma região quilombola ou 20 hectares no Pontal do Paranapanema. Quilombolas e assentados são pequenos produtores que precisam de assistência igualmente, cada qual com suas demandas.
Source: Rural

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