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(Foto: Marcelo Curia/Editora Globo)

 

Criada para promover um protocolo único no combate a Covid-19 em frigoríficos, a portaria conjunta publicada pelos ministérios da Agricultura, Economia e Saúde na semana passada ignorou uma série de observações feitas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), que foi consultado duas vezes pelo governo, a última delas dias antes da publicação das regras. 

Em ofício enviado no dia 2 de julho, a Coordenadoria Nacional de Defesa de Meio Ambiente do Trabalho (Codemat) aconselhou a adoção de um padrão de máscara para proteção, necessidade de distanciamento mínimo na linha de produção, afastamento de contactantes de casos suspeitos e a testagem em massa dos trabalhadores – sugestões que não foram incluídas no texto final da portaria.

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“A nossa participação no processo de elaboração do protocolo único não foi uma participação de legitimação como documento pronto e acabado. Temos pontos divergentes que permanecem”, ressalta Luciano Leivas, coordenador da Codemat.

Na avaliação dele, as novas regras não apresentaram “nenhum avanço em relação ao que já vem sendo praticado pela indústria e que falhou para um grande número de empresas do setor”. “Em geral,  a forma como ela está colocada acaba por legitimar o que as empresas estão praticando, impedindo uma maior prevenção controle do risco biológico”, avalia Leivas.

Sem controle

 

Entre os pontos mais sensíveis destacados pelo procurador do trabalho, estão a não testagem dos trabalhadores antes da reabertura de plantas potencialmente suspensas e o não afastamento de trabalhadores contactantes de casos suspeitos.

“Se esse casos suspeitos se confirmarem, você deixou de afastar um contactante contaminado, impedindo o controle do cadeia de transmissão”, explica. A portaria também define casos suspeito como aquelas que apresentarem síndrome respiratória aguda, sintoma mais grave da Covid-19, que também inclui febre, cansaço, coriza, perda de olfato e outros associados a gripe comum.

Nosso entendimento é de que essa portaria é uma autorização para aumentar a matança dos trabalhadores dentro dos frigoríficos

Artur Bueno de Camargo, presidente da CNTA

A Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria de Alimentação e Afins (CNTA) orientou suas associadas regionais a questionarem a norma nos tribunais de primeira instância, dado que as portarias publicadas pelo poder executiva não estão submetidas ao controle de constitucionalidade do Supremo Tribunal Federal. 

Em Brasília, a CNTA fará campanha junto aos parlamentares para derrubar a norma na esfera legislativa. “É urgente isso. Não dá mais para permitir essa situação em que o governo aprova leis que permitem a disseminação da doença entre os trabalhadores e, consequentemente, na sociedade”, afirma Artur Bueno de Camargo, presidente da entidade.

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“Se o entendimento de especialistas na área de saúde é que, dentro estabelecimentos comerciais, não pode ter mais que 30% da lotação de pessoas, por que dentro do frigorífico é permitido ter 100% das pessoas? Os trabalhadores de frigoríficos valem menos?”, questiona Camargo.

Novos casos

 

Nesta semana, a Justiça do Trabalho voltou a interditar frigoríficos no país. No Paraná, uma unidade da Avenorte Avícola Cianorte, com sede em Cianorte, teve suas atividades suspensas por 14 dias para testagem em massa de seus funcionários. O número de trabalhadores infectados passou de três para 193 em 22 dias.

Se o número de contaminados está aumentando vertinosamente somente entre os empregados da empresa, é porque o ambiente laboral está contribuindo para a eclosão da doença

Rodrigo da Costa Clazer, juiz do trabalho substituto no PR, em decisão judicial

No Rio Grande do Sul, o Ministério Público do Trabalho informou nesta terça-feira (23/6) que 4.957 trabalhadores de frigoríficos tiveram teste com resultado positivo para a Covid-19 distribuídos em 32 plantas de 23 municípios do Estado. 

“Os frigoríficos são ambientes de trabalho propícios para disseminação do vírus causador da Covid-19, em razão da elevada concentração de trabalhadores em ambientes fechados, com baixa taxa de renovação de ar, baixas temperaturas, umidade e com diversos postos de trabalho que não observam o distanciamento mínimo apto a viabilizar segurança durante a prestação de serviços”, afirma o órgão, em nota.

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Até agora, três empresas firmaram Termo de Ajustamento de Conduta de abrangência nacional com o MPT para controlar a Covid-19: BRF, Aurora e Marfrig. Em âmbito regional, os acordos com a indústria somam 81 frigoríficos, abrangendo 170 mil trabalhadores. Entre os compromissos, estão triagem periódica, rotina de testes e distanciamento mínimo de um metro entre trabalhadores na linha de produção, não incluídos na norma federal.

Segurança jurídica

 

Em nota, a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) afirmou que recebeu com otimismo a nova portaria para o setor e que as mudanças garantirão “mais segurança jurídica para a manutenção do abastecimento de alimentos no Brasil, um dos pontos mais importantes para a estabilidade social em tempos de pandemia”.

“Ao mesmo tempo, o elevado nível de exigências da norma reafirma o comprometimento do Brasil com a preservação da saúde dos colaboradores do setor produtivo e a segurança dos alimentos, o que permite ao país seguir em sua missão de apoiar a segurança alimentar das nações importadoras”, afirma a entidade representativa da indústria.
Source: Rural

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