Robô autônomo aplica raios ultravioleta C na plantação (Foto: Divulgação)
*Publicado originalmente na edição 414 de Globo Rural (abril/2020)
Os pesquisadores norte-americanos, inspirados nas estufas europeias, que usam luz ultravioleta C para combater doenças em frutas e hortaliças, estão testando essa nova técnica na produção extensiva em pomares de morangos na Flórida, nos Estados Unidos.
O resultado foi o controle de até 90% do oídio, doença causada por fungo, que afeta a fotossíntese e a produtividade das plantas. O desempenho alcançado nos experimentos é igual ou superior ao obtido com os melhores fungicidas disponíveis no mercado, informa o brasileiro Rodrigo Borba Onofre, doutorando da Universidade da Flórida.
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“Trata-se de um controle sustentável para cultivos orgânicos ou convencionais. O menor uso de químicos ajuda na redução de resíduos nas frutas, além de retardar o surgimento de resistência das pragas aos fungicidas”, explica Onofre, um dos integrantes do projeto, que conta ainda com pesquisadores da Universidade Cornell e do Centro de Pesquisa de Iluminação do Instituto Politécnico Rensselaer, ambos no Estado de Nova York, e do Instituto Norueguês de Pesquisa em Bioeconomia, da Noruega.
Os primeiros testes de campo começaram em 2016, com um equipamento movido a trator. Ao tomar conhecimento do projeto, a empresa norueguesa Saga Robotics desenvolveu, em 2018, um robô autônomo, com GPS, batizado de Thorvald, que se move à velocidade média de 1,5 km/h e emite raios ultravioleta C por meio de dezenas de lâmpadas.
A aplicação de luz dura cerca de seis segundos em cada planta e deve ser feita aos primeiros sintomas de doença, sempre à noite, já que muitos fungos são resistentes à radiação durante o dia. “A aplicação noturna danifica o DNA do fungo, impedindo-o de se reproduzir”, explica Onofre.
(Foto: Divulgação)
No ano passado, o robô passou a ser experimentado também no combate à antracnose e ao mofo cinzento, outras doenças provocadas por fungos, e também no controle de ácaros. Na safra que começou a ser plantada na metade de março, os pesquisadores vão testar o equipamento em cultivos de pepino e melão.
Dois protótipos do Thorvald estão atualmente em uso, na estação experimental da Universidade da Flórida, na cidade de Wimauma, e em uma fazenda comercial de morangos localizada em Plant City, ambas nesse Estado do sul dos Estados Unidos.
Ainda não há previsão de quando o robô chegará ao mercado. O grande desafio é o alto custo do equipamento – em torno de 60 mil euros. “É preciso massificar a produção do equipamento para torná-lo mais acessível ao produtor”, resume o pesquisador brasileiro.
Fermentação digital
Próxima aos vales Napa e Sonoma, as mais famosas regiões produtoras de vinhos dos Estados Unidos, a vinícola UC Davis, implantada experimentalmente pela Universidade da Califórnia, é modelo mundial em tecnologia e sustentabilidade.
Entre as práticas ambientais adotadas pela vinícola estão a reciclagem de 90% da água utilizada no processo de fabricação, a captação de energia limpa por placas solares e o rastreamento digital da fermentação.
Nos 152 tanques de 200 litros da UC Davis, a fermentação é monitorada por meio de um sistema desenvolvido em parceria com uma empresa de tecnologia do Vale do Silício, a Cypress Semiconductor.
Rastreamento digital da fermentação (Foto: Divulgação)
G"A fermentação é fundamental para definir as características do vinho, por isso é tão importante o controle dessa etapa para garantir a qualidade do produto”, explica Raul Cauduro Girardello, pesquisador brasileiro de pós-doutorado do Departamento de Viticultura e Enologia da UC Davis, que trabalha na vinícola desde 2014.
Girardello lembra que problemas de levedura ou temperatura inadequada não identificados a tempo podem comprometer toda a produção de um tanque. Com o sistema de rastreamento digital da fermentação – que gera dados a cada 5 minutos sobre o teor de açúcar, a densidade do vinho e a temperatura dos bagaços e do mosto –, a vinícola não corre esse risco.
Em experimentos iniciados há quatro anos, pesquisadores da UC Davis passaram a usar imagens de satélites para analisar a relação entre o índice de área foliar dos vinhedos e a quantidade de flavonóis – os compostos que ajudam na estabilidade da cor durante o envelhecimento dos vinhos tintos.
Os testes comprovaram que a retirada das folhas perto dos cachos aumenta a radiação solar, ajudando na concentração do composto que confere qualidade às uvas. Desde o ano passado, a técnica passou a ser usada comercialmente em vinhedos da Califórnia.
O pesquisador brasileiro Raul Cauduro Girardello, da vinícola UC Davis (Foto: Divulgação)
Robô agrícola
Imagine um pequeno robô munido de câmeras e sensores percorrendo a lavoura e registrando a altura e sanidade das plantas, o diâmetro dos caules, o índice foliar e a qualidade das espigas de grãos.
Esse trabalho já é feito pelo TerraSentia, um equipamento autônomo desenvolvido pela startup americana EarthSense, incubada no Parque de Pesquisa da Universidade de Illinois, na cidade de Champaign, a 200 quilômetros de Chicago.
Desenvolvido em 2017, o robô agrícola está sendo testado em lavouras de milho, soja, trigo, cana-de-açúcar, sorgo, frutas e nozes nos Estados Unidos, Brasil, Chile, Índia e França. No Brasil, o equipamento está em experimentação no campus de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP).
“Por meio de algoritmos, o software do TerraSentia converte dados em informações sobre fitossanidade e desenvolvimento, além de detectar eventuais problemas nas lavouras”, explica Chinmay Soman, um dos sócios e fundadores da EarthSense, ao lado de Girish Chowdhary, professor de engenharia agrícola e biológica da Universidade de Illinois.
O robô TerraSentia monitora lavoura de milho (Foto: Divulgação)
O robô agrícola está entre os menores do mundo (13,6 quilos e 32 centímetros de largura), o que facilita o seu deslocamento no campo, encaixado entre as linhas de plantio. “Essa mobilidade permite que ele colete dados que drones e satélites não identificam”, acrescenta Soman.
A medição de fenótipos de culturas agrícolas normalmente é feita por humanos, em amostragens. Com o uso do robô, que é capaz de cobrir até 30 hectares por dia, a seleção de materiais genéticos é mais rápida e completa. Ele pode ser utilizado sozinho ou em grupo, no caso de produções maiores.
O TerraSentia já é usado comercialmente na pesquisa e melhoramento de sementes nos Estados Unidos. A previsão da EarthSense é de disponibilizar a produtores a partir de 2021. Hoje ele custa em torno de US$ 10 mil, mas quando alcançar escala de produção esse preço pode cair a US$ 1 mil, prevê Soman.
Apesar dos avanços dos robôs agrícolas nos últimos anos, ele admite que ainda é um desafio tornar os equipamentos autônomos confiáveis ao longo de um tempo maior. “Os agricultores precisam que os robôs sejam totalmente autônomos durante semanas, o que ainda é bem difícil”, admite.
Source: Rural