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Patrícia administra a Fazenda Santa Cruz do Pau D'Alho, no interior de São Paulo (Foto: Ricardo Benichio)

 

Ela nasceu no antigo Hospital Matarazzo, em São Paulo, passou muitos finais de semana na fazenda da família, em Bebedouro, fez trabalho voluntário na adolescência, se formou em psicologia, mas aos 33 anos largou as sessões e a capital para assumir a gestão da propriedade rural no interior paulista.

Em 2018, sob o comando de Patrícia Marta Matarazzo, a Fazenda Santa Cruz do Pau D’Alho se tornou a primeira do país em cana-de-açúcar a conquistar o certificado internacional SAI (Iniciativa de Agricultura Sustentável).

Com 533 hectares, sendo 240 de cana e 96 de laranja, e 20 funcionários, a propriedade abriga também um museu de carros antigos, um projeto educacional de reflorestamento e uma biblioteca recheada de livros, maquetes de barcos e outros objetos que pertenceram ao bisavô de Patrícia, o conde Francesco Matarazzo, e a seu pai, Eduardo André Matarazzo.

O desafio da transição

“Não pense que foi fácil. Eu já passava dois dias por semana na fazenda acompanhando o trabalho do meu pai, mas tive de assumir sozinha o negócio após a morte dele ou a gente ia perder a propriedade. No início, sentava no escritório e chorava todos os dias porque não entendia nada de adubação, plantio, colheita ou gestão de funcionários, e as pessoas não tinham paciência para me explicar”, diz.

Na fazenda de gado da família, em Guaranésia (MG), que hoje é administrada pelo irmão mais novo, Fernando, a experiência foi ainda pior: os peões não respeitavam uma chefe mulher e caíam na gargalhada quando ela era alvo de jatos de urina das vacas.

Patrícia conta que, nos primeiros anos, teve de ser agressiva e autoritária, contrariando sua personalidade. “Tive de apelar para frases do tipo ‘faz porque eu estou mandando’.” O conhecimento ela foi buscar em livros, na internet, em informações de agrônomos e num curso de gestão.

No meio rural, já existe igualdade de gênero, exceto nos salários. Nesse ponto, as mulheres têm de avançar mais

 

A certificação internacional foi um teste. Com a fazenda já estruturada e com um histórico de ações ambientalistas, Patrícia foi escolhida pela parceira Tereos, uma das maiores produtoras mundiais de açúcar, para obter o primeiro SAI da cana. O pai já era arrendatário da Tereos, mas ela decidiu mudar o status para fornecedora, se encarregando dos tratos culturais e da escolha das mudas. Por ano, entrega cerca de 21 mil toneladas de cana à Tereos. 

Nos últimos anos, a empresária tem investido na laranja, que foi a primeira cultura da fazenda e também tem certificação. Ela lembra que sempre foi mais difícil negociar a fruta com as indústrias.

“Nas reuniões, eles cresciam para cima de mim. Eu tinha de aceitar o preço ou deixar de colher.” Atualmente, ela produz 70 mil caixas por ano e faz parte de um pool de 40 produtores que vendem 5 milhões de caixas à indústria.

Mudança de perspectiva

Patrícia afirma que, nos primeiros anos, o fato de ser mulher e inexperiente impactou muito seu relacionamento com funcionários e parceiros. Hoje, no entanto, diz que o mercado reconhece sua competência, independentemente do gênero. “No meio rural, já existe igualdade de gênero, exceto nos salários. Nesse ponto, as mulheres têm de avançar mais.”

O sobrenome Matarazzo não facilitou a trajetória dela. “Traz muita credibilidade, é verdade, mas as pessoas pensam que eu tenho tudo, sou rica e não preciso trabalhar. Quando preciso cotar algum serviço ou produto, por exemplo, não posso usar o sobrenome, porque o preço sempre aumenta.”
Source: Rural

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