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Arnaldo Zunizakae em trator usado no plantio da última safra de soja em MT. (Foto: Mayke Toscano/Ed. Globo)

Os Paresi, tribo que planta soja e milho em seu território localizado em Campo Novo do Parecis, no Norte de Mato Grosso, foram um dos grupos indígenas que assinaram a carta lida pelo presidente Jair Bolsonaro hoje pela manhã durante a Assembleia Geral da ONU, em Nova York.
Na safra passada, liderados por Arnaldo Zunizakae, 47 anos, a tribo colheu soja em 10 mil hectares em uma das aldeias da Chapada dos Parecis.

Os Paresi estão em pé de guerra com o Ministério Público Federal e o governo há vários anos. Eles iniciaram o plantio mecanizado na aldeia 15 anos atrás em parceria com fazendeiros da região. Por conta disso, enfrentam ações do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama) e a oposição de algumas entidades indigenistas.

O órgão já aplicou 44 multas, que totalizam R$ 129,2 milhões, e embargou 16.200 hectares sob a acusação de os índios terem arrendado ilegalmente essas terras na safra 2017. O Ibama constatou ainda o plantio de milho transgênico na reserva, proibido por lei. Foram autuados 16 arrendatários, duas fazendas e cinco associações indígenas. Arnaldo, conhecido como Branco, admite o plantio de milho transgênico, mas nega que os Paresi tenham arrendado as terras. Com a ajuda da Fundação Nacional do Índio (Funai), a tribo tenta anular as multas.

Em fevereiro, os Paresi receberam a ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Tereza Cristina, que prometeu mudar a legislação para que os agricultores indígenas possam produzir em larga escala em suas terras.

Arnaldo falou à revista Globo Rural sobre o Grupo de Agricultores Indígenas, a carta lida pelo presidente Bolsonaro na ONU e a participação de Ysani Kalapalo, indígena do Xingu, na comitiva brasileira em Nova York.

GLOBO RURAL – Quando foi formado este grupo de agricultores indígenas e quais são os seus objetivos?
ARNALDO ZUNIZAKAE – Este grupo foi formado há três anos para buscar no governo federal o ambiente para se criar uma política voltada para a agricultura indígena, e quando a gente fala em agricultura indígena,  a gente está falando desde a agricultura tradicional, a agricultura familiar, até uma agricultura parecida com que os povos Paresi praticam em Mato Grosso.

GLOBO RURAL – Qual é a ligação do Grupo com o governo Bolsonaro?
ZUNIZAKAE – O nosso grupo não é vinculado à nenhuma ONG, nem ao governo diretamente. É um grupo de agricultores formado por mais de 50 etnias de várias partes do Brasil que deseja regularizar as atividades agrícolas que hoje os povos praticam. Nós criamos um grupo para dialogar com os diversos setores que têm  responsabilidade sobre a agricultura no Brasil.

GLOBO RURAL – Quais são os problemas que o Grupo quer resolver?
ZUNIZAKAE – Nós queremos resolver desde questões de regularização das áreas que já trabalhamos aos licenciamentos necessários. Estamos discutindo nos ministérios uma forma dos indígenas poderem comercializar o excedente da produção que hoje é colhida nas aldeias. Estamos buscando linhas de crédito onde os indígenas possam se encaixar para desenvolver suas atividades.

GLOBO RURAL – A indígena Ysani Kalapalo representa o Grupo de Agricultores Indígenas?
ZUNIZAKAE – A carta que foi citada hoje na ONU pelo presidente Bolsonaro deu respaldo à Ysani Kalapalo, que foi convidada para fazer parte da comitiva do governo. Nós, os índios, entendemos que ela precisava de um aval nosso. Nós então fizemos uma carta de apoio, dando-lhe aval para nos representar na ONU, assim como o Raoni também tem o aval da população indígena. Foi a primeira vez que um indígena é convidada para acompanhar o presidente numa reunião importante como essa.

GLOBO RURAL – O Grupo apoia o atual governo?
ZUNIZAKAE – Este diálogo com o governo existe há mais de três anos. Eu já estive em diversos locais que os ex-presidentes Lula e Dilma estiveram aqui em Mato Grosso, porém os governos anteriores nunca nos deram a oportunidade de conversar. Eles sempre dialogaram com as ONGs que representavam os povos indígenas. Neste governo nós estamos tendo a oportunidade de sentar à mesa juntamente com a Funai, o Ibama e o governo federal para discutir uma política para os nossos povos, neste novo momento que a população indígena passa. Nosso objetivo é regularizar atividades que nós já exercemos em nosso território. Estamos tendo a oportunidade neste momento de levar a nossa voz para o mundo, de fazer parte do nosso cenário do novo governo brasileiro. Isso nos almejávamos há muitos anos, ter a participação direta do indígena sem intermediário.

GLOBO RURAL – O presidente falou que acabou o monopólio de Raoni.
ZUNIZAKAE – O nosso manifesto não desqualifica o Raoni. A nossa carta não cita isso. A gente entende o Raoni como uma liderança importante, porém não tem nada que o autorize a nos representar mundialmente. Nós respeitamos o Raoni pelo que ele faz para algumas etnias, nem todas, e é claro que ele defende uma política de preservação ambiental e isso é importante. E ele faz isso lá fora com a oportunidade que ele tem. Muito das coisas que o Raoni faz serve para nós também.

GLOBO RURAL – Quem representa os povos indígenas?
ZUNIZAKAE – Nós estamos falando de mais de 200 povos no Brasil. Nunca nós vamos conseguir uma unanimidade para apoiar a Ysani, como também não vamos conseguir para apoiar o Raoni. O próprio presidente Bolsonaro não é apoiado pela maioria da população brasileira.
Source: Rural

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