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O coordenador de alternativas econômicas da Associação Indígena Khïsêtjê, Yaiku Suya (Foto: Vinicius Galera/Ed. Globo)

 

O óleo de pequi produzido pela Associação Indígena Khīsêtjê (pronuncia-se “kinsêdje”), do Parque Indígena do Xingu, foi um dos vencedores do Prêmio Equatorial 2019, concedido pela ONU a cada dois anos para “soluções locais e indígenas de desenvolvimento sustentável”.

A premiação, divulgada na última quarta-feira (5/6), teve mais de 847 inscritos de 127 países. Apenas 22 associações e comunidades foram vencedoras. O prêmio, que deverá ser entregue aos Khīsêtjê em uma cerimônia a ser realizada em Nova York em setembro, tem o valor de US$ 10.000,00.

“Esse prêmio é uma oportunidade para continuarmos com o trabalho com o pequi feito na nossa associação. Nós ficamos muito felizes de ver o pequi do Khīsêtjê sendo premiado. É um bom incentivo para continuarmos nosso trabalho”, disse à Globo Rural o coordenador de alternativas econômicas da associação, Yaiku Suya.

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Yaiku falou com a reportagem de Globo Rural durante a Bio Brazil/BioFach, feira voltada para o mercado de orgânicos encerrada no último sábado em São Paulo. Neste ano, os indígenas do Xingu levaram dois produtos para a feira: o mel orgânico e o óleo de pequi. Yaku soube da premiação durante o evento. Além do prêmio da ONU, ele foi eleito o maior produtor de mel do Xingu durante encontro – ao qual não estava presente – entre os apicultores do parque realizado entre os dias 27 e 29 de julho.

“Ainda tem muita coisa para fazermos com o pequi. Temos a castanha, o doce, o molho de pequi com pimenta e estamos começando a fazer sabonete. Vamos usar o recurso para buscar capacitação, que deve ajudar muito no nosso trabalho”.

No ano passado, segundo o Instituto Socioambiental, a safra de pequi dos Khīsêtjê foi recorde, com produção de 315 litros.

“Em meu trabalho, acompanho várias produções e faço um controle de qualidade da pimenta, do óleo e da castanha de pequi”. A castanha é um dos novos produtos que estão sendo testados pela associação. “Estamos começando a mexer para ver como é a sustentabilidade da produção e começar a divulgar”.

O mel e o óleo de pequi orgânicos produzidos no Parque Indígena do Xingu (Foto: Vinicius Galera/Ed. Globo)

 

De acordo com o comitê da ONU, os vencedores do Prêmio Equatorial, como o óleo de pequi dos Khīsêtjê, "estão desenvolvendo soluções baseadas na natureza para as mudanças climáticas e o desenvolvimento local sustentável". 

Esta não é a primeira vez que os índios do Xingu recebem o prêmio. Em 2017, a Associação Terra Indígena do Xingu (Atix), que representa os 16 povos que vivem no parque, venceu com a produção de mel orgânico certificado. A Atix foi a primeira organização indígena a obter o selo de conformidade orgânica do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. 

As associações indígenas do parque e do ISA esperam que, até o ano que vem, o óleo de pequi também possa ser certificado pelo mesmo sistema.

“Como o produto está no mercado, ele tornou-se uma prioridade. O óleo de pequi é 100% orgânico e chegou a hora de comprovarmos isso. Os índios veem esse movimento como um contrassenso, pois tudo o que produzem é orgânico, mas eles entendem que as regras de mercado trazem visibilidade e credibilidade ao produto”, disse o engenheiro agrônomo Marcelo Martins, articulador territorial do ISA no Xingu e também na TI Panará.

Desmatamento, recuperação de florestas e alternativas econômicas

Tradicionalmente, os Khīsêtjê viviam em uma região próxima à área onde seria criado o Parque Indígena do Xingu em 1961. Ameaçados por pressões externas, passaram a viver dentro dos limites do parque. Em 1998 tiveram seu território ancestral homologado com a criação da Terra Indígena Wawi, localizada no município de Querência (MT) e dentro do Território Indígena do Xingu.

Na ocasião, o território estava fortemente degradado devido à invasão de fazendeiros, e ainda sofre com a pressão da agricultura empresarial.

Dados do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite, sob responsabilidade do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, apontam que 6.200 hectares foram desmatados apenas em 2018. O plantio de pequizais na região foi uma forma encontrada pelos Khīsêtjê para recuperar suas áreas. 

“Dentro da terra tradicional, existiam duas fazendas. Eles decidiram plantar um lote de pequi experimental e passaram a observar que o pequi e o pasto combinado tinha um potencial”, diz Marcelo.

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Yaiku chama a atenção para os perigos do desmatamento e para o trabalho de regeneração com a exploração econômica da floresta. “Estamos vendo que nossos lugares sagrados estão ocupados pelas fazendas, que também ocupam as nascentes dos rios. Com isso, o veneno que utilizam vem até o rio. Estamos muito preocupados com a caça e o peixe. Por isso temos vários trabalhos dentro da aldeia. Muitos falam que nós, índios, não produzimos nada, mas nós não vivíamos com o capital. Estamos começando a entender o que é a produção que pode servir e alimentar a sociedade”.

“Chegou a hora de explorarmos nossa produção. Mas não vai ser fazendo lavoura para desmatar tudo o que temos. Nosso manejo é diferente. Nós plantamos o pequi porque sabemos que ele dá a árvore, a sombra, o ar e a fruta. Estamos começando a pesquisar. Se temos o produto precisamos pensar bem como podemos produzir para vender”.

Como muitas lideranças no Xingu, Yaiku é contrário à entrada da chamada “roça mecanizada” no parque.

“Nós não temos condições de mexer com lavoura. O governo não vai dar de graça as condições para começarmos nosso trabalho. Tudo vai precisar ser comprado com dinheiro emprestado pelo banco. Então o próprio indígena vai explorar sua terra conforme lhe interessa, de forma a não prejudicar sua comunidade nem ninguém. Há muitas iniciativas e estamos começando a alinhar o trabalho.”

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Source: Rural

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